PENSAMENTOS DE UM “CORRERIA”

por FERRÉZ


“Ele não terá homenagem póstuma se falhar. Pensa: “Como alguém usa no braço algo que dá pra comprar várias casas na quebrada?”



ELE ME
olha, cumprimenta rápido e vai pra padaria. Acordou cedo, tratou de acordar o amigo que vai ser seu garupa e foi tomar café. A mãe já está na padaria também, pedindo dinheiro pra alguém pra tomar mais uma dose de cachaça. Ele finge não vê-la, toma seu café de um gole só e sai pra missão, que é como todos chamam fazer um assalto.

Se voltar com algo, seu filho, seus irmãos, sua mãe, sua tia, seu padrasto, todos vão gastar o dinheiro com ele, sem exigir de onde veio, sem nota fiscal, sem gerar impostos.

Quando o filho chora de fome, moral não vai ajudar. A selva de pedra criou suas leis, vidro escuro pra não ver dentro do carro, cada qual com sua vida, cada qual com seus problemas, sem tempo pra sentimentalismo. O menino no farol não consegue pedir dinheiro, o vidro escuro não deixa mostrar nada.

O motoboy tenta se afastar, desconfia, pois ele está com outro na garupa, lembra das 36 prestações que faltam pra quitar a moto, mas tem que arriscar e acelera, só tem 20 minutos pra entregar uma correspondência do outro lado da cidade, se atrasar a entrega, perde o serviço, se morrer no caminho, amanhã tem outro na vaga.

Quando passa pelos dois na moto, percebe que é da sua quebrada, dá um toque no acelerador e sai da reta, sabe que os caras estão pra fazer uma fita.

Enquanto isso, muitos em seus carros ouvem suas músicas, falam em seus celulares e pensam que estão vivos e num país legal.

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MULHER VANGUARDA

Ontem, nos meandros da noite primitiva,
A vagar na insegurança dos espaços,
A mulher foi retaguarda.
Nas florestas, cavernas e palafitas,
O homem caçador
Hauria nos olhos e regaço da mulher,
A força da sua sobrevivência.
Ainda ontem,
Observando a lição das sementes,
A mulher desdobrou-se no amanho da terra,
Criando a agricultura,
A pecuária,
E concentrou ao pé de si, homens e animais.
Foi paiol,
Aconchego nos dias de suor,
Mesa cheia nas horas de repouso,
Bálsamo nas lutas e cicatrizes,
Mãe, esposa, filha e irmã do homem patriarca,
Chefe de clã.
Nessa hora, a mulher abriu caminho ao companheirismo e à civilização.
As cidades se ergueram por toda parte
E com elas cresceu a arrogância masculina,
Do retinir das armas dos fortes
Sobrevindo a escravidão dos fracos.
Surgiram os dominadores,
Cézares e mecenas, com seus gládios e seu dinheiro.
A mulher foi serva e objeto.
Idolatrada nos templos,
Mas imolada pela supremacia masculina.
Divinizada em palavras e canções pelos poetas e menestréis,
Na realidade, simples serviçal,
Instrumento de trabalho e prazer.
Mesmo reduzida à sombra ao longo dos milênios,
Engravidou energias,
Acumulou experiências
E com suas mãos tranquilas e confiantes
Rasgou as nuvens da hipocrisia.
Derrubou altares,
Arrasou senzalas,
Semeou esperanças.
A mulher foi Eva e foi Diana,
Foi Lia e foi Raquel,
Foi Minerva e foi Judite,
Foi Maria.
Sempre a ajuda decisiva,
A ternura restauradora,
O incentivo eficaz.
Hoje, sopra o vento irresistível,
O vento reconstrutor da igualdade,
E a nova mulher floresce com seu espaço assegurado.
A mulher é vanguarda na comunidade,
Nos sindicatos, nos partidos,
Em todas as tribunas e trincheiras,
Ao lado do pai, do companheiro,
Do irmão e do filho.
Mulher ação,
Mulher liberdade,
Mulher equidade,
Mulher cidadã.

Maria Dorneles,
poetisa de Porto Alegre, RS.

CCA

Ideias brotadas em uma reunião,
O barzinho dispensado,
Toró, inundação,
Duas horas e meia parado.
Parado.
Parado.
Na Lapa.
Parado.
Parado.
Parado.
Falta ar, sobra fome e sede.
Parado…
Finalmente trânsito!
E o trânsito era Lagos, Mumbai e Pequim.
Alívio… quebrada.
Casa.
Dezessete quilômetros entornados em três horas e meia.
Sem gelo.


Alê
(em um dia
de chuva qualquer )

Nota de repúdio do Centro Acadêmico Benevides Paixão ao desfecho violento da manifestação do último dia 13 de janeiro:

“O Centro Acadêmico Benevides Paixão, entidade estudantil dos cursos de Jornalismo e Comunicação em Multimeios, da PUC-SP, vem manifestar completo asco à reação da polícia militar (PM) em resposta a manifestação organizada nesta última quinta-fera contra o aumento das tarifas de ônibus, na cidade de São Paulo.

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BOM-DIA, MEU NOME É SHEILA

Segue um bom documentário sobre o setor de telemarketing, Bom-dia, meu nome é Sheila – Como trabalhar em telemarketing e ganhar um vale-coxinha. Trata-se de uma ficção, inspirada na reportagem da Vanessa Bárbara, publicada na Revista Piauí. Apesar de ser tudo em um tom de sátira, a pesquisa para a produção da reportagem foi muito bem feita e, neste caso, posso falar de cadeira. A maioria das situações apresentadas no filme se não senti na pele já vi acontecer com outra pessoa, inclusive o caso da laringite “repentina”.

Um dos únicos equivocos apontados é a média salárial: R$ 10 mil anuais. Atualmente, essa média é de R$ 7.200,00. Talvez menos, já que boa parte das empresas pagam somente um salário mínimo.

Dados:
1. Segundo o Sindicato dos Trabalhadores em Telemarketing (Sintratel), os transtornos psíquicos são responsáveis por 27% dos casos de adoecimento no setor, os distúrbios osteomusculares relacionados ao trabalho (Dort) respondem por 39%, problemas de audição e de voz, 25%; outros, 9%.

2. A tese do doutor Airton Marinho da Silva, “A regulamentação das condições de trabalho no setor de teleatendimento no Brasil: necessidades e desafios” – que, no documentário, é apresentado como dr. Eduardo Marinho da Silva – é muito boa e quem tiver interesse pode baixá-la aqui (vale ler ao menos o capítulo O tempo de adoecimento – pg 32): TeseAirton.pdf

O filme (17 minutos): Porta Curtas

A reportagem da Piauí: Edição 1 > mundo do trabalho

Alê